Aposentados apresentam maior satisfação com a vida, aponta pesquisa da UFMG
Estudo da Faculdade de Medicina indica, no entanto, um declínio a partir do terceiro ano após a aposentadoria; tendência é retomada no oitavo ano
Desenvolvida com base em dados do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil), pesquisa do Programa de Pós-graduação em Saúde Pública da Faculdade de Medicina da UFMG indica que servidores aposentados apresentam maior satisfação com a vida em relação aos não aposentados.
O trabalho é tema da tese de doutorado da pesquisadora Jôsi Fernandes, sob a orientação das professoras Luana Giatti e Sandhi Maria Barreto, do Departamento de Medicina Preventiva e Social (MPS). O objetivo foi analisar o nível de satisfação de vida dos aposentados, em comparação com os servidores ainda ativos, assim como observar variações segundo gênero e tipo de ocupação.
Ao todo, foram estudados mais de 13 mil servidores públicos, entre ativos e aposentados, avaliados de 2012 a 2014, por meio de entrevistas e exames clínicos e laboratoriais. O artigo foi publicado no Cadernos de Saúde Pública.
Para medir a satisfação com a vida, componente do bem-estar, foi utilizada a Escala de Satisfação com a Vida de Ed Diener e colaboradores, na qual são apresentadas cinco questões para serem respondidas utilizando sete opções que variam de “concordo totalmente” a “discordo totalmente”.
‘Lua de mel’ e desencanto
Nos três primeiros anos, os aposentados declaram estar mais satisfeitos com a vida na comparação com servidores que se mantêm ativos. Logo após esse período, é observado um declínio na satisfação que segue até o oitavo ano.
Segundo a pesquisadora, uma possível explicação é que a pessoa fica especialmente animada ao se aposentar, mas, após algum tempo, outros fatores, como o sentimento de perda de vínculos trabalhistas e a redução da rede de relacionamentos sociais, podem impactar negativamente nessa percepção.
“É muito importante que haja um planejamento antes mesmo da aposentadoria acontecer, tanto na dimensão financeira quanto na pessoal. O aposentado precisa estar familiarizado com esse novo momento de vida, que pode ser diferente do período de trabalho”, afirma Jôsi.
Após esse período de declínio, o indicador mostra que a satisfação com a vida volta a subir. O melhor resultado foi encontrado no grupo que se aposentou entre 8 e 15 anos atrás.
Natureza do trabalho
A natureza das atividades realizadas no trabalho (manual ou não manual) foi considerada nos resultados. Para a surpresa dos pesquisadores, a satisfação com a vida após a aposentadoria, de maneira geral, se manteve independentemente da atividade exercida.
O mesmo aconteceu em relação ao recorte de gênero. Jôsi Fernandes entende que é possível que as diferenças de gênero na situação profissional sejam menos evidentes entre servidores públicos de instituições de ensino e pesquisa, como no caso da amostra analisada.
“Em outras realidades, é possível que haja uma diferença maior entre homens e mulheres em seus cargos de trabalho, provocando maior ou menor satisfação com a vida quando aposentados. Entre servidores públicos, a diferença é mínima”, avalia a pesquisadora. Os servidores públicos aposentados que compunham a amostra desse estudo recebiam proventos similares aos salários dos trabalhadores ativos nos mesmos cargos. No entanto, mudanças nas regras de aposentadoria em 2019 poderão impactar no cenário, afirma Jôsi Fernandes.
A pesquisa foi financiada e apoiada pelos ministérios da Saúde e da Ciência e Tecnologia e Inovação, pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
Investigação multicêntrica
O Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa) é uma investigação multicêntrica que reúne 15 mil servidores de instituições públicas das regiões Nordeste, Sul e Sudeste do Brasil. A pesquisa tem o propósito de avaliar a incidência e os fatores de risco para doenças crônicas, em particular, as cardiovasculares e o diabetes.
Em cada centro integrante do estudo, os voluntários – com idade de 35 a 74 anos – fazem exames e entrevistas de quatro em quatro anos aproximadamente para avaliar a saúde e obter informações sobre aspectos como condições de vida, trabalho e comportamentos que podem afetar seu bem-estar, como a dieta.
Em Minas Gerais, o centro de pesquisa está instalado no Hospital Borges da Costa, anexo ao Hospital das Clínicas. O projeto é coordenado pelas professoras Sandhi Maria Barreto e Luana Giatti, da Faculdade de Medicina.
Além de compreender os fatores que contribuem para a incidência dessas doenças na população brasileira, o estudo visa produzir evidências científicas para subsidiar a adequação de políticas públicas de saúde às necessidades nacionais.