Fhemig nega, mas comissão da ALMG avalia que fechamento de bloco cirúrgico do Hospital Maria Amélia Lins está impactando maior Pronto Socorro do Estado.

Fhemig nega, mas comissão da ALMG avalia que fechamento de bloco cirúrgico do Hospital Maria Amélia Lins está impactando maior Pronto Socorro do Estado.

Pacientes nos corredores do Hospital Pronto Socorro (HPS) João XXIII aguardando há vários dias por cirurgias ortopédicas foram encontrados pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) em visita técnica realizada à unidade nesta segunda-feira (17/3/25).

Entre os casos, dona Eva, 79 anos, foi às lágrimas ao relatar num corredor lotado no primeiro piso que há uma semana espera por um procedimento cirúrgico no ombro.

O objetivo da visita, pedida pela deputada Bella Gonçalves (Psol), que preside a comissão, foi verificar o impacto do fechamento, em dezembro, do bloco cirúrgico do Hospital Maria Amélia Lins (HMAL) sobre o João XXIII.

O HMAL atuava como retaguarda do HPS, recebendo pacientes já estabilizados depois de cirurgias no João XXIII e que precisavam de continuidade no tratamento ou até novas cirurgias ortopédicas.

Apesar de ter sido divulgado à época do fechamento que a reabertura do bloco do Amélia Lins para suporte ao HPS se daria tão logo fosse comprado um novo equipamento imprescindível às cirurgias, que havia sido danificado, nos últimos dias o Governo do Estado anunciou a terceirização do HMAL.

Segundo Maria Lúcia Barcelos, do conselho local de saúde, a situção atual vivenciada por pacientes no HPS seria “criminosa e degradante”. Ela disse à comissão que além do João XXIII já ser uma unidade sobrecarregada, está agora atendendo a cirurgias eletivas que antes eram feitas no HMAL, atrasando o atendimento de cirurgias de maior urgência.

A médica psiquiatra Paula Aparecida Gomes disse que a espera nos corredores do HPS por cirurgias tem levado ao adoecimento psiquiátrico de muitos pacientes, demandando medicação não somente contra a dor, mas contra ansiedade, estresse e depressão.

“O que temos visto tem a ver com maus-tratos de pessoas já em situação de fragilidade socioeconômica. E também não sei se hoje o hospital terá condição de acionar um plano de contigência no caso de necessidade em um acidente maior, com por exemplo dez vítimas de uma vez.”
Paula Aparecida Gomes
Médica psiquiatra

Pacientes relatam espera no HPS e pressão para deixar Amélia Lins

Kellen Canpolian, designer de unhas, mora em Patos de Minas (Alto Paranaíba) e usa uma órtese numa das pernas há três anos. Por causa de uma queda sofrida há um mês, ela contou que precisa de um procedimento cirúrgico por ter quebrado o pé.

Entre idas e vindas entre várias unidades de saúde de sua cidade e de Belo Horizonte, Kellen disse que na última vez  foi direcionada do HMAL ao HPS, onde há oito dias aguarda uma solução para o seu caso. “Aqui está todo mundo no corredor e desesperado. Eles não têm resposta pra ninguém”, desabafou.

Situação semelhante relatou Fábio Henrique. Vítima de um acidente de carro, ele disse que quebrou o quadril e aguarda há dias por uma cirurgia. Contou ter chegado na quinta-feira da semana passada ao Amélia Lins, lá ficando por três dias, até ceder à pressão da direção e se transferir para o João XXIII.

“Não queria aceitar, porque sabia que ficaria no corredor. Mas o coordenador lá pagou um Uber para me trazer e agora estou há dois dias ainda em observação no Pronto Socorro”, criticou ele.

Segundo o relato de servidores e outros pacientes, a pressão para desocupação do Amélia Lins vem na esteira da tercerização da unidade, também visitada pela comissão nesta segunda (17).  No HMAL, o bloco cirúrgico foi encontrado desativado e em obras, e pelo menos um paciente ainda resistindo a deixar a internação.

Gabriel Rodrigues frequenta a unidade desde 2022, quando sofreu uma fratura exposta no tornozelo, que lhe rendeu sequelas de osteomielite, infecção dos ossos.

Esporadicamente, como agora, ele precisa de antibióticos endovenosos, curativos e cirurgia para raspagem do osso, e tenta resistir a pressões para se mudar para o HPS.

“Não aceito ir para o João XXIII para ficar jogado já no corredor ao deus-dará”, explicou, contando que na sexta-feira passada chegou a ligar para a polícia ao te sido novamente pressionado a se mudar para o HPS.

Fhemig nega impacto

Apesar dos relatos de espera por cirurgias feitos à comissão, o diretor do Complexo de Urgência e Emergência da Fhemig, a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais, Fabrício Giarola, disse que o fechamento do bloco do HMAL não impactou negativamente no HPS.

Segundo ele, servidores do HMAL foram transferidos para o HPS e teria havido inclusive aumento da produtividade em cirurgias no João XXIII, que teria conseguido absorver as demandas. O diretor disse que os cancelamentos de procedimentos em janeiro e fevereiro deste ano, em relação ao mesmo perído do ano passado, teriam inclusive caído.

Fabrício Giarola argumentou que o João XXIII é uma unidade de emergência e urgência de porta aberta, onde as demandas chegam a todo momento, num fluxo dinâmico. Segundo ele, a média de atendimento diário é de 300 pacientes, e, durante a visita desta segunda (17), o quadro não se configurava como de superlotação, porque a unidade ainda conseguiria internar mais 70 pacientes.

Sobre a razão da terceirização do HMAL, em vez da reabertura do bloco para retaguarda do HPS, o diretor da Fhemig argumentou que o projeto agora é que o Amélia Lins seja um hospital exclusivamente cirúrgico e para demandas eletivas do SUS do município.

Comissão constata atendimento caótico e fará audiência sobre situação

A deputada Bella Gonçalves rebateu a argumentação da Fhemig avaliando que a visita técnica revelou atendimento prestado de forma caótica e sem dignidade no João XXIII.

“Vimos demandas por cirurgias de urgência com espera de 8 a 15 dias, de pessoas correndo risco de infecção e a direção afirmando que não há impactos”, criticou ela, frisando que a discussão da situação vai continuar em audiência pública da comissão, nesta quarta-feira (19/3), na ALMG.

Presente à visita, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) também avaliou que a situação encontrada foi desrespeitosa para pacientes e servidores e alertou que a proposta do governo de fato passaria pela privatização de serviços de saúde, por meio da criação do Serviço Social Autônomo de Gestão Hospitala (SSA-Gehosp),  prevista em projeto do Executivo que tramita na ALMG.

O deputado Lucas Lasmar (Rede) acusou o governo de falta de planejamento na destinação pretendida para o HMAL e também contestou posição da Fhemig. “Não há como falar que o fechamento do bloco do Amélia Lins não teve impacto no João XXIII com pacientes no corredor da forma como vimos”, reiterou.

 

Legenda da foto em destaque: com pacientes espalhados pelos corredores do João XXIII esperando atendimento, deputados avaliaram situação como caótica e desrespeitosa Foto: Alexandre Netto
Fonte: Pacientes em corredores do Hospital João XXIII aguardam por cirurgias ortopédicas – Assembleia Legislativa de Minas Gerais