UFMG é a primeira universidade brasileira a institucionalizar acervo LGBT+
Mantido pelo Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT+ (NUH), acervo, que será aberto à comunidade em novembro, está localizado em sala especial
A Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (Fafich) da UFMG aprovou, no início de julho, a institucionalização do acervo LGBT+ mantido pelo Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT+ (NUH) da Universidade. Com a decisão, a Universidade é a primeira instituição pública de ensino superior brasileira a ter um acervo LGBT+. Localizado em sala especial da biblioteca da unidade, o Acervo LGBT+ Cintura Fina reúne arquivos da memória da comunidade na cidade de Belo Horizonte.
O objetivo do acervo é resgatar, registrar, difundir e preservar o patrimônio, relacionado a práticas, memória e produções culturais da comunidade LGBT+, assim como lugares, imagens e documentos. Para tanto, o acervo se vale, também, de histórias de pessoas LGBT+ que marcaram os cenários local e nacional.
“O nome do acervo homenageia Cintura Fina, uma dissidente sexual, figura não propriamente travesti, mas do que hoje denominaríamos queer: foi uma importante personagem LGBT+ no cenário de Belo Horizonte”, explica texto de apresentação do projeto, publicado no site do NUH.
Coordenador do NUH, o professor Marco Aurélio Prado considera que a institucionalização do acervo contribui para o aprimoramento da democracia no Brasil. “A institucionalização, aprovada pela Congregação da Fafich, representa um reconhecimento institucional da sociabilidade LGBT+. É também um passo importante para o fortalecimento da democracia brasileira, porque o acervo traz visibilidade a trajetórias que nunca foram percebidas como parte da história da nossa sociedade”, diz.
Portas abertas para a pesquisa
Segundo Marco Prado, o Acervo LGBT+ Cintura Fina, que poderá ser consultado pela comunidade universitária a partir de novembro, “abre as portas para um universo de pesquisas e interrogações acerca da história da comunidade LGBT+, permitindo, por meio de um olhar para o passado, percepções sobre o presente e também sobre o futuro”. Os documentos também servirão para subsidiar pesquisas e a composição de exposições.
Marco Prado afirma que a institucionalização ajuda a “trazer para a pauta do presente, histórias que foram, na verdade, experimentos de liberdade e de questionamento aos parâmetros que decidem a sociabilidade, a diversidade corporal, de gênero e sexualidade de um certo tempo”. A preservação de histórias invisibilizadas, defende o professor, também materializa a preservação dos direitos humanos dessas pessoas. Uma delas, lembra Prado, é a própria Cintura Fina, que dá nome ao acervo. “Mais do que uma homenagem, essa escolha também representa a busca pela reafirmação da importância dessa pessoa e das experiências queer, até hoje criminalizadas, patologizadas e incompreendidas pela sociedade.”
Composição
O Acervo LGBT+ Cintura Fina é formado por documentos, cartas, fotos, recortes de revistas e jornais e outras mídias doadas por pesquisadores. Um deles é o especialista em memória LGBT Luiz Morando, doutor em literatura comparada pela UFMG. Autor do livro Enverga, mas não quebra: Cintura Fina em Belo Horizonte, biografia da travesti que dá nome ao acervo, Morando doou sua coleção pessoal, mantida de 1987 a 2019, ao projeto.
Em entrevista à Rádio UFMG Educativa, na época de lançamento da biografia, Morando defendeu a importância de registrar memórias, lembranças e experiências de vida das pessoas LGBT+. “Buscar essa preservação ativamente é importante porque muitos registros estão se perdendo. Há pessoas que já faleceram e não temos mais acesso ao que essas pessoas construíram durante sua vida, seja em forma de cartas, fotografias e até mesmo de homenagens recebidas. O registro é importante porque nenhuma cultura se constitui sem a guarda, preservação e manutenção da sua própria memória. Quanto mais essa memória se perde, mais fraca essa cultura se torna e mais fracos os grupos sociais que constituem essa cultura se tornam. Recolher, guardar, preservar, manter e estudar essa memória é muito importante não só para fortalecer a memória passada, mas também a autoestima desse público”, afirmou.
Além de Luiz Morando, que doou grande parte dos materiais sobre a Cintura Fina que compõem o acervo recém-institucionalizado, o coordenador do NUH, Marco Prado, destaca também o papel decisivo da bibliotecária Vilma Carvalho de Souza, coordenadora da biblioteca da Fafich, que atualmente abriga o acervo, para a construção e consolidação do projeto. “Além de ser uma funcionária exemplar, a Vilma foi uma batalhadora pelo acervo. Como coordenadora da biblioteca da Fafich, ela abraçou o projeto desde o início, conseguindo a sala especial que hoje recebe o acervo agora institucionalizado pela Universidade”, destaca.
(Com base em texto de Hugo Rafael para o Portal UFMG | com informações do NUH)